Levantamento da Associação dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil aponta que não há déficit da Previdência e, sim, superávit
O governo interino de Michel Temer sinaliza uma série de medidas que
vão de encontro aos direitos sociais trabalhistas do povo brasileiro.
Aos poucos — ainda com a indefinição se Dilma Rousseff volta ou não a
assumir a Presidência — ele vem “costeando o alambrado”.
Recentemente, foi publicado no Diário Oficial da União a Medida
Provisória 739/2016, com o objetivo de fazer alterações na Lei
8.213/1991, que prevê o Plano de Benefícios da Previdência Social. Neste
momento, ela tramita em uma comissão mista de senadores e deputados.
A intenção é, dentre outras medidas, revisar os benefícios do
auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, concedidos administrativa e
judicialmente há mais de dois anos, através da convocação dos segurados
para a realização de nova perícia médica. Importante lembrar que, em
2014, foi promulgada a Lei 13.063, advinda de projeto de minha autoria,
que isenta o aposentado por invalidez acima de 60 anos de exame
médico-pericial.
O argumento usado para realizar estas mudanças é a retórica de que a
Seguridade Social está falida. Temos que ter muita calma e expressos
cuidados neste momento. É de suma importância fazer alguns
esclarecimentos para que todos possam fazer suas conclusões.
Levantamento da Associação dos Auditores Fiscais da Receita Federal
do Brasil (Anfip), através do estudo “Análise da Seguridade Social”,
aponta que não há déficit e, sim, superávit. Isso mesmo. O leitor mais
atento vai se perguntar: mas todos os governos dos últimos 20 anos não
falavam em déficit?
Em 2006, o superávit da Seguridade foi de R$ 59,9 bilhões; 2007, R$
72,6 bi; 2008, R$ 64,3 bi; 2009, R$ 32,7 bi; 2010, R$ 53,8 bi; 2011, R$
75,7 bi; 2012, R$ 82,6 bi; 2013, R$ 76,2 bi; 2014, R$ 54 bi. Logo os
valores de 2015 estarão à disposição.
Esses números são esclarecedores e demonstram, categoricamente, que a
Seguridade Social é viável. Tanto que, depois de 15 anos de muita luta,
fizemos um golaço e conseguimos derrubar o fator previdenciário, e
aprovamos a fórmula 85/95 para aposentadorias.
Outra questão que não é levada em conta. Querem prorrogar a
Desvinculação das Receitas da União (DRU) até o ano de 2023, e ampliar
de 20% para 30% o percentual que o governo pode retirar dos recursos
sociais. Se a medida for aprovada, a perda dos cofres da Seguridade será
de R$ 120 bilhões por ano. Como é possível abrir mão desse dinheiro?
Não sei qual a intenção, mas não podemos nos calar diante de tais
medidas. Não é com a retirada de benefícios sociais trabalhistas que o
país vai encontrar o rumo do crescimento e do desenvolvimento.
Há, sim, medidas que são convergentes na sociedade e que poderiam ser
implantadas de imediato. Vejamos: a realização de uma ampla reforma
tributária, a revisão do pacto federativo, o estabelecimento de taxa de
juros que estimule o mercado sem empobrecer a população, a valorização
do salário-mínimo, o combate à corrupção e à sonegação.
Aliás, segundo a ONU, o Brasil perde por ano R$ 200 bilhões em
corrupção. Estudo do Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da
Receita aponta que o país perde R$ 100 bilhões com o contrabando, por
ano; em 2014 foram R$ 500 bilhões de sonegação; em 2015, somente no
primeiro semestre, a sonegação foi de R$ 258 bi. Será que o Brasil
precisa de reformas previdenciária e trabalhista se tudo isso for
cobrado?
O certo é que todo esse montante poderia ser investido em saúde;
educação; segurança pública; nas estradas, para o escoamento da
produção; em aeroportos; portos; em projetos sociais; no aumento do
salário-mínimo e dos proventos dos aposentados e pensionistas.
Há uma expressão que era usada por Leonel Brizola e que se adapta
muito bem aos dias atuais. Quando ele via que a situação piorava de vez e
que um vendaval se avizinhava, dizia: “Preteou o olho da gateada”.
Paulo Paim é senador (PT-RS)